quarta-feira, outubro 19, 2005

Que A Força Esteja Comigo

Na quarta classe os meus amigos queriam ser futebolistas ou polícias, as miúdas na maioria bailarinas, apenas uma murmurou “Princesa”, e o caixa-de-óculos da turma disse “Astronauta”, enchendo-me de coragem na resposta à professora: “Jedi!” A princípio, achei que por a mulher não me ter levado a sério, os olhos dela se tornaram elásticos, esticaram esticaram, até não perceber o que era olho e onde estavam as sobrancelhas. Foi assustador aquele olhar ter como alvo a minha cara. Os Jedi são guardiães da paz e da justiça, o lado bom da Força. Aprendera isso na noite passada com o meu primo mais velho a dormir lá em casa e no vídeo a cassete dele: Episode V – The empire strikes-back. Foi então que percebi, tal olhar, do negro da ardósia, onde a giz branco ela listou a profissão de cada um, era raiva e malvadez, agora eu sabia. Sabia que o lado negro da Força era assim. Que os Sith nunca estiveram extintos e o seu mestre Darth Vader tinha servos assim, com olhares daqueles. Por isso no dia seguinte, fui de roupão castanho para a escola. Levei o meu primeiro sabre, que não tinha luz nem som, mas enfrentei-a na sala dizendo “Wuaaaommm, wuaaaommm”, e os olhos dela outra vez elásticos frente ao cabo de vassoura com tinta fluorescente que eu movia qual Luke Skywalker. O meu primeiro contacto com o lado negro da Força. A minha professora. É preciso ser destinado para estas coisas.

Do 5º ano ao 9º fui barra em Inglês. Apliquei-me imenso, na certeza de que no Templo Jedi, o treino e os estudos seriam dados nesta língua, os episódios do Star Wars não o mentem. Devo também admitir a sorte nas professoras de Inglês, nenhuma delas evidenciou o Mal em si, ao contrário da outra, a da primária. As outras disciplinas, uma razia. Talvez por isso no 9º ano completei os estudos e o meu pai ufano: “Arranjei-te emprego, aprendiz de mecânico de aviões, de acordo com o teu gosto por naves”. “Não são essas naves”, corrigi. “Anda tudo no ar.” Apeteceu-me dizer-lhe que quem anda no ar é ele. A cabeça dele. Nunca disse nada. A mesada secou e dinheiro é dinheiro. Assim, troquei a túnica do capuz castanho pelo fato-macaco azul sulfato, a cor da empresa onde há 2 anos já não sou aprendiz. O ordenado inchou. Isso nota-se na minha fantástica colecção de miniaturas do Star Wars. Actualmente posso reviver as minhas cenas favoritas onde quiser. Ainda hoje, houve o fim do Episódio IV com Obi-Wan Kenobi morto na minha almofada. Depois retirei-o porque ele ressuscita. Logo a seguir, recriei o final extraordinário do episódio fundamental da segunda saga, o V, aquele a ensinar-me como enfrentar a outra na primária, a luta do Bem contra o Mal. Mais uma vez assisti-o na minha própria cama, colocando Luke a ouvir Darth Vader: “Eu sou o teu pai”. Que confronto. Que diálogo. A surpresa da minha vida.

Tudo isto começou na quarta classe e isso persegue-me, culpo a minha namorada. Emendo: ex-namorada. Nunca pensei que após 17 anos ela continuasse com a profissão de “Princesa”. No mínimo ridículo. Há pessoas realmente infantis para toda a vida. Todos estes anos a vê-la com dois totós enrolados de cada lado e a avisá-la, a avisá-la, o que um gajo não faz por amor. Até ao momento. “Mas porquê?”, perguntou-me, não tem meia hora. “Não percebes que Princesa Leia há só uma e não és tu? Esse penteado é dela!” Custou-me este mundo e todos os astros do Universo, mas não vamos entrar por aí, coisas do amor, não vamos entrar por aí. Há pessoas que não sabem quando é altura de stop e parou de fingir, parou de brincar, parou o faz-de-conta. Ela é dessas. Para me refazer do choque, só um site que encontrei na Internet: “Encontra o teu nome no mundo Star Wars!” António Júnior, preencho. O meu novo nome a aparecer: Júnónio Antior. Real, não é? É esta Guerra que me dá força, a Força. E não sou único. Recebi um e-mail encaminhado por outros (ia escrever fãs mas não) seguidores da série, a informar que não estou só, que posso juntar-me a eles. Juntos são já 16% dos britânicos a seguir a religião Jedi. Como ignorar? Tudo isto começou aos dez anos, cedo, eu sei, eu sei que o candidato a Jedi é detectado, identificado, levado para a Ordem em criança. Só estive no lugar errado à hora certa. Parto tarde, mas parto a horas para terras de Sua Majestade. Eu sou um Jedi!

Espero que este e-mail o encontre com a Força, Sr. George Lucas.

Júnónio Antior

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