Lusco-Fusco
Gosto de te ver dormir, entesourado de barriga para baixo imprimindo uma cova de linho nos lençóis, porque fico a sorrir para um sorriso metade nos lábios metade amachucado na almofada e além disso não ressonas. Por isso encolho-me sentada e agarro os joelhos no meu lado da cama só transposto por uma das tuas pernas enquanto a outra apanha ar fora do colchão. Não sei se sabes, mas ficas sempre tatuado por um cabelo meu e quando respiras esvoaça o fio preto que volta a aterrar entre a tua pálpebra e a vírgula cicatrizada que tens no queixo. Certifico-me sempre que tenho o teu cheiro a sono ao escorregar os cinco dedos pela cara. Não sei porquê, mas agora consigo realmente acreditar que existe a tal cúpula envidraçada guardada a arco e flecha por Artémis, como escrevinhaste em poema nas costas da conta dos pastéis de Belém enquanto lanchávamos esta tarde. Estavas também despenteado, logo não foi por isso que nos vi sob vidro rachado entre estilhaços e uma seta no chão. Assim saio de mansinho às escondidas de Morfeu enquanto dormes e sonhas porque de certeza, nos teus sonhos amanhã eu não fui embora.
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